Aos cantores e músicos que não as conhecem, sempre que posso conto a história de famosos cantores da fé, porque foram e são milhares. Descobriram que tocam e cantam bem e oferecem a Deus e aos sofredores e adoradores o seu talento.
Alguns deles trabalharam pela unidade. Outros sentiram que não podiam seguir com a Igreja do seu tempo. Foi o caso do padre Ário, cuja história faz pensar. Sofreu pelo que dizia e cantava do seu púlpito e fez a Igreja do seu tempo sofrer com o seu melodioso púlpito.
Duro na queda, encontrou dois bispos, também eles duros na queda. Recebeu a proteção de outros dois bispos que tomaram suas dores. E bateu de frente contra 380 bispos que, em Nicéia, ano 325 não assinaram em baixo da sua ideia nem da sua canção.
Exilado e proibido de falar e exercer o ministério, prosseguiu pregando e cantando o que achava certo. O imperador voltou atrás. Ário morreu um dia antes de, por ordem do imperador, ser reinstalado como sacerdote católico em Alexandria, função que lhe fora proibida em 318. Aos olhos de alguns, foi herói. Aos de outros, foi vilão. Aqueles eram tempo de tronos e de púlpitos em conflito eo trono manava no púlpito.
Principais personagens: Em Antioquia padre Ário, bispos Alexandre e Atanásio; em Nicomédia, bispos Eusébio e Teognos, outros 500 bispos e os imperadores Constantino e Constâncio.
O padre cantor morreu em 336, depois de lutar quase 25 anos por suas ideias. Constantino morreu em 332. Naqueles dias entre 300 e 360 uma simples letrinha “i” fez toda a diferença. Seria como por uma vírgula no lugar errado.
***
Ilustremos os fatos com a história do rei que enviou mensagem de resposta ao seu general que derrotara e prendera o rei inimigo. Na carta o general perguntava e deveria executá-lo. O rei respondera: -“Não, executá-lo seria um risco para o reino” O escriba suprimiu a vírgula. O general executou o rei prisioneiro. Uma simples vírgula mudou a interpretação do executor.
***
No caso do padre cantor Ário e da controvérsia que ele suscitou, um simples “i” no meio de dois “oo” em língua grega pôs fogo no império e na fé daqueles dias. Traduzidas a palavras, homoousios significava “igual” e homo-i-ousios significava: “semelhante”. O Filho era igual ao Pai ou era apenas semelhante? A questão perdura até hoje em algumas igrejas que seguem a visão do padre cantor.
***
Quem era Jesus para Ário e os bispos que o defenderam e quem era Jesus para os bispos que a ele se opuseram? Quem era para o imperador Constantino e para Constâncio que transformaram a questão em questão política e assunto do império?
Naqueles dias a maioria dos cristãos ainda não havia definido como crer e o que dizer sobre Jesus. Amá-lo era uma coisa, segui-lo era outra, defini-lo ainda outra! Era como hoje: milhões de fiéis sequiosos por respostas para seus sofrimentos seguem um pregador que os encanta, mesmo não entendo quase nada do que ele diz sobre Jesus. Ficam com a parte pragmática: Jesus cura e dá paz! Se ele é Deus ou não é, se é igual, maior ou menor do que o Pai, se há um Espirito Santo não faz diferença para eles. Ficam com o pregador que lhes garante que Jesus atende suas preces, cura, salva e dá paz! Querem mais o que os antigos filósofos chamavam de Theoria x Phronesis ou Mathein X Pathein. É difícil traduzir, mas num todo significam entender X fruir e captar X experimentar.
***
Ário era bem-intencionado e também os bispos o eram. Mas boa intenção nem sempre é boa definição. E foram as definições de Ário e, mais tarde, de vários outros pregadores que provocaram os incêndios espirituais e políticos daqueles dias.
Afinal, aquele que criou o universo esteve ou não esteve entre nós? E ele é um ou três pessoas? Até hoje ateus e religiosos de outras correntes se riem dos cristãos por espalhar esta ideia, segundo eles, estapafúrdia de um Deus em três pessoas, das quais uma se encarna e morre numa cruz. Jesus é o Filho de Deus encarnado? E ele é eterno ou foi criado pelo Pai? O Pai existiu primeiro, o Filho em segundo e o Espirito Santo em terceiro?
Ário quis explicar isso. E o fez escrevendo e cantando porque era exímio pregador, exímio cantor e um homem extraordinariamente bonito e charmoso. Era negro, africano, inteligentíssimo e brilhante. Seus oponentes também eram negros daqueles que honram a raça negra. Atanásio era miúdo, mas um gigante no conteúdo. Aqueles dias revelaram jovens extraordinariamente cultos como Tertuliano, Orígenes e Atanásio para citar apenas alguns. Na História da humanidade podem ser listado scomo gigantes do saber. A cultura do padre cantor Ário não era de se desprezar.
***
A teologia naqueles dias passava por Roma, mas passava também por Constantinopla e pelo Norte da África. E não opunha brancos contra negros nem vice-versa; opunha conceitos antagônicos sobre a encarnação. Jesus era ou não era Deus. Era a grande questão do começo do século IV, inícios dos anos 300. A Igreja sofria por fata de definições. Pouco antes outro inflamado pregador sacudir a Igreja com suas teorias sobre o Espirito Santo. Chamava-se Montano. Sua doutrina sobre inspiração, sobre novas revelações e novas profecias, sobre o após-Cristo e sobre pessoas iluminadas sacudira a Igreja. Ele chegara ao ponto de se proclamar a encarnação do Espirito Santo. Depois de suas profecias e de suas profetizas Priscila e Maximila a igreja começou a tomar posição contra qualquer um que se proclamasse apto a traduzi a vontade de Deus para o seu tempo. Venceria a doutrina do bispo Cipriano de Cartago que propunha que o crer da Igreja passasse pelos bispos em sínodo ou concílio e não por padres e leigos iluminados.
Ário ensinava que Jesus era Deus até certo ponto. Fora criado pelo Pai e lhe era subordinado. Era de substancia semelhante, mas não era igual nem da mesma substância divina. Na verdade, negava que Jesus fosse Deus. Fez dele um semideus. Esperto, não negou a divindade: apenas a diminuiu e submeteu ao Pai. Eram tais as discussões que uma doutrina chamada patripassionismo ou patripassianismo propunha que como é impossível que um ser humano resgate a humanidade, quem morreu na cruz foi o Pai. Outros raciocinavam que só um humano- divino poderia morrer na cruz. O Filho era, pois, uma só pessoa, mas tinha duas naturezas. A humana morreu na cruz, a divina lhe deu sentido. A natureza divina não abandonou a natureza humana, mas o Homem-Deus Jesus, qual cordeiro divino morreu pelos nossos pecados.
Outras religiões e ateus de hoje riem pelos cantos da boca ao ouvir tal teologia. Mas os cristãos também têm razões para rir dos ateísmos e das outras religiões cujas afirmações também estão cheias de tergiversações. Poderia ser, foi , não foi, é não é, tal partícula gerou outras e por conseguinte…estamos chegando à partícula de Deus…A ciência ateia também já deu inúmeras respostas erradas sobre a vida, sua origem e sua concepção e sobre o morrer. Há mistérios na ciência humana e há mistérios na fé.
Onde acabam as certezas sobre Jesus e onde começa a fé? Ário quis responder com certeza. Também os outros quiseram. O imperador Constantino que embora em 312 tivesse dado aos cidadãos do império a liberdade de culto, mandava na fé pagã e cristã, recorreu aos bispos a princípio aceitou que Jesus era o Filho igual ao Pai. Gerado não criado! Consubstancial ao Pai.
Ário foi exilado. Mais tarde foi a vez de Atanásio amargar cinco exílios. Os dois estavam atrapalhando a vida do império. Mais tarde Constantino voltou atrás, deu ordem para que Alexandria recebe de novo Ário como padre, mas Ário- já o lembramos- morreu de repente em 332 um dia antes de seu retorno. Envenenado como soia acontecer naqueles dias? Enfarto de emoção pela dureza dos embates? Nunca se saberá. Constantino morreria em 336 professando as doutrinas de Ário.
Eram tempos confusos. Qualquer um pregava e qualquer um que tivesse influencia mercadológica, politica e de marketing arrebanhava multidões. Não estranhemos se agora quem mais faz adeptos é quem prega o capitalismo, a mais valia, o sucesso financeiro abençoado, a vitória do indivíduo em Cristo, a riqueza como benção e a prosperidade como teologia. Não foram poucos os que naqueles dias seguiram quem mais certeza oferecesse e ficasse com ele até o fim.
Duros na queda esses dois portentosos negros, orgulho daqueles dias, como gladiadores da Palavra se enfrentaram num duelo de gigantes da fé e do pensamento. Ário perdeu. Atanásio venceu. Hoje oramos o credo influenciado pelo pequeno e grande Atanásio que disse que o “i” de homo-i-ousios negava o Cristo. Jesus era o Cristo e não era só semelhante ao Pai. Era igual, da mesma natureza, gerado eternamente e não a parti de um tempo, não criado, consubstancial. Era eternamente o Filho, mas, por nossa salvação se fez homem e voltará um dia para julgar gloriosamente o mundo. Por enquanto ele se manifstapela sua Igreja.
Depois surgiriam controvérsias que duram até hoje sobre qual igreja o representaria. Os ortodoxos de Constantinopla garantem que são eles que romperam com Roma em 1054 e dizem que os católicos romanos é que são dissidentes. Depois no idos de 1.500, pela voz principalmente do ex monge católico alemão Martinho Lutero vieram os protestantes que hoje se chamam evangélicos e dizem que nós, os católicos romanos nos desviamos das Escrituras. Mais tarde vieram outros evangélicos e os pentecostais que se proclamam mais fiéis aos evangelhos e que romperam com os evangélicos históricos.
A controvérsia parece não acabar nunca. Haverá sempre um novo fundador de novas doutrinas, e novas igrejas a garantir que com eles está a mais verdadeira interpretação as escrituras e que o outro já era, perdeu, perderá e que o mundo e a fé serão como eles.
Há sempre um Ário e um Atanásio a se enfrentarem e os fiéis de um lado e outro a dialogarem ou a se esfolarem vivos ou com palavras duras e ferinas. O datismo deles, a pregação deles, os santos deles, as doutrinas deles, a história deles, os pecados deles, a mensagem deles não valem mais. Deus não age no templo deles. Está certo que saímos deles, mas os infiéis são eles. Saímos para sermos mais fiéis à doutrina original. Quando alguém deles peca, dá-se um jeito de abafar e quando um do lado oposto peca, salienta-se e dá-se um jeito de levar a todo o rebanho que o pregdor de lá prevaricou.
De fato, os tempos mudaram pouco. Ário, Montano, Nestório, Mani, Donato têm seguidores. Também Alexandre, Atanásio, Orígenes e Tertuliano. Estão nos púlpitos de seus templos e nas ruas e praças deixando claro que fora de seu movimento não há salvação. Não deixam a decisão para Deus. Pregam misericórdia, mas antecipam a condenação para quem não aderir à sua doutrina. Nas propostas daqueles irmãos de ontem e até dos imperadores havia boas e más intenções. Hoje também. O difícil é perceber em tempo aonde levam determinadas doutrinas e práticas da fé.
Na madrugada de sexta feira, dia 6 de julho de 2012, quando os católicos festejavam a virgem mártir adolescente Maria Goretti que não se deixou estuprar por Alessandro Serenelli, que de sereno nada tinha, um pregador às 4 da madrugada, pela televisão, programa comprado a peso de outro, desafiava outras igrejas a mostrar o que ele podia mostrar ali mesmo: a cura de câncer de duas irmãs de sangue. A seguir, deblaterava contra outros pregadores, contra o governo e dizia estar pronto a morrer por sua doutrina. Lembrava Ário, Atanásio e outros pregadores dos velhos tempos. Como no século IV era difícil saber quem era mais cristão porque os discursos eram duros, agora continua difícil saber quem é cristão porque os discursos andam endurecendo.
Dois jovens pela Internet no tiwtter insistiam que fora a Igreja ninguém se salvará.
Acharam no discurso e nos escritos do Papa Bento que nunca disse isso, algo que contradissesse João Paulo II na sua Ut Unum Sint, e o Vaticano na sua Unitatis Redintegratio. Podemos oferecer nossa Igreja como caminho mais seguro, mas não compete anos dizer quem se salvará e quem se perderá. O discurso da Igreja mudou, mas o deles não. Ficaram com o Concílio de Latrão e declarações do remoto passado. Quando endurecem os discursos do pregadores de um lado e de outro quem perde é a verdade, a caridade e o diálogo. Jesus dialogava e deixou liberdade para ficar com ele ou ir embora dele.
No fundo de todas as questões a pergunta é a mesma: Se Deus esteve aqui e se encarnou, esteve para quê? . Mandou Pedro guardar a espada na bainha (Mt 26,52) e aos discípulos fechados na redoma do “só nós” disse que respeitassem o homem que exorcizava demônios sem ser do grupo, mas que não ridicularizava seu nome. ( Mc 9,38-41) Um simples copo de água dado por conta de sua doutrina de amor já dispõe alguém para ser seu discípulo. Talvez estejamos preocupados de menos com a doutrina e demais com o marketing da fé. Deveríamos por em primeiro lugar a paz e a caridade, sem esquecer a pureza da doutrina. E se não for possível? Teremos que seguir tentando.
Pior será se insistirmos em dizer que os que não são da nossa igreja irão para o inferno… Se um bispo ou um papa dissesse isso hoje seria considerado herege!
Estamos perdendo milhões de fiéis, mas seria pior se perdêssemos o bom senso e a caridade. Para entrar no céu nãot em que ser católico, mas também não tem que ser evangélico. Tem é que ser caridoso! Se não sabemos lavar não atrapalhemos aquele que morreu na cruz para salvar a todos! ( Jo 12,32 ) Ário tinha seu valores, mas talvez sua canção tenha ido longe demais. Não aceitou corrigi-la.
Alguns deles trabalharam pela unidade. Outros sentiram que não podiam seguir com a Igreja do seu tempo. Foi o caso do padre Ário, cuja história faz pensar. Sofreu pelo que dizia e cantava do seu púlpito e fez a Igreja do seu tempo sofrer com o seu melodioso púlpito.
Duro na queda, encontrou dois bispos, também eles duros na queda. Recebeu a proteção de outros dois bispos que tomaram suas dores. E bateu de frente contra 380 bispos que, em Nicéia, ano 325 não assinaram em baixo da sua ideia nem da sua canção.
Exilado e proibido de falar e exercer o ministério, prosseguiu pregando e cantando o que achava certo. O imperador voltou atrás. Ário morreu um dia antes de, por ordem do imperador, ser reinstalado como sacerdote católico em Alexandria, função que lhe fora proibida em 318. Aos olhos de alguns, foi herói. Aos de outros, foi vilão. Aqueles eram tempo de tronos e de púlpitos em conflito eo trono manava no púlpito.
Principais personagens: Em Antioquia padre Ário, bispos Alexandre e Atanásio; em Nicomédia, bispos Eusébio e Teognos, outros 500 bispos e os imperadores Constantino e Constâncio.
O padre cantor morreu em 336, depois de lutar quase 25 anos por suas ideias. Constantino morreu em 332. Naqueles dias entre 300 e 360 uma simples letrinha “i” fez toda a diferença. Seria como por uma vírgula no lugar errado.
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Ilustremos os fatos com a história do rei que enviou mensagem de resposta ao seu general que derrotara e prendera o rei inimigo. Na carta o general perguntava e deveria executá-lo. O rei respondera: -“Não, executá-lo seria um risco para o reino” O escriba suprimiu a vírgula. O general executou o rei prisioneiro. Uma simples vírgula mudou a interpretação do executor.
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No caso do padre cantor Ário e da controvérsia que ele suscitou, um simples “i” no meio de dois “oo” em língua grega pôs fogo no império e na fé daqueles dias. Traduzidas a palavras, homoousios significava “igual” e homo-i-ousios significava: “semelhante”. O Filho era igual ao Pai ou era apenas semelhante? A questão perdura até hoje em algumas igrejas que seguem a visão do padre cantor.
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Quem era Jesus para Ário e os bispos que o defenderam e quem era Jesus para os bispos que a ele se opuseram? Quem era para o imperador Constantino e para Constâncio que transformaram a questão em questão política e assunto do império?
Naqueles dias a maioria dos cristãos ainda não havia definido como crer e o que dizer sobre Jesus. Amá-lo era uma coisa, segui-lo era outra, defini-lo ainda outra! Era como hoje: milhões de fiéis sequiosos por respostas para seus sofrimentos seguem um pregador que os encanta, mesmo não entendo quase nada do que ele diz sobre Jesus. Ficam com a parte pragmática: Jesus cura e dá paz! Se ele é Deus ou não é, se é igual, maior ou menor do que o Pai, se há um Espirito Santo não faz diferença para eles. Ficam com o pregador que lhes garante que Jesus atende suas preces, cura, salva e dá paz! Querem mais o que os antigos filósofos chamavam de Theoria x Phronesis ou Mathein X Pathein. É difícil traduzir, mas num todo significam entender X fruir e captar X experimentar.
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Ário era bem-intencionado e também os bispos o eram. Mas boa intenção nem sempre é boa definição. E foram as definições de Ário e, mais tarde, de vários outros pregadores que provocaram os incêndios espirituais e políticos daqueles dias.
Afinal, aquele que criou o universo esteve ou não esteve entre nós? E ele é um ou três pessoas? Até hoje ateus e religiosos de outras correntes se riem dos cristãos por espalhar esta ideia, segundo eles, estapafúrdia de um Deus em três pessoas, das quais uma se encarna e morre numa cruz. Jesus é o Filho de Deus encarnado? E ele é eterno ou foi criado pelo Pai? O Pai existiu primeiro, o Filho em segundo e o Espirito Santo em terceiro?
Ário quis explicar isso. E o fez escrevendo e cantando porque era exímio pregador, exímio cantor e um homem extraordinariamente bonito e charmoso. Era negro, africano, inteligentíssimo e brilhante. Seus oponentes também eram negros daqueles que honram a raça negra. Atanásio era miúdo, mas um gigante no conteúdo. Aqueles dias revelaram jovens extraordinariamente cultos como Tertuliano, Orígenes e Atanásio para citar apenas alguns. Na História da humanidade podem ser listado scomo gigantes do saber. A cultura do padre cantor Ário não era de se desprezar.
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A teologia naqueles dias passava por Roma, mas passava também por Constantinopla e pelo Norte da África. E não opunha brancos contra negros nem vice-versa; opunha conceitos antagônicos sobre a encarnação. Jesus era ou não era Deus. Era a grande questão do começo do século IV, inícios dos anos 300. A Igreja sofria por fata de definições. Pouco antes outro inflamado pregador sacudir a Igreja com suas teorias sobre o Espirito Santo. Chamava-se Montano. Sua doutrina sobre inspiração, sobre novas revelações e novas profecias, sobre o após-Cristo e sobre pessoas iluminadas sacudira a Igreja. Ele chegara ao ponto de se proclamar a encarnação do Espirito Santo. Depois de suas profecias e de suas profetizas Priscila e Maximila a igreja começou a tomar posição contra qualquer um que se proclamasse apto a traduzi a vontade de Deus para o seu tempo. Venceria a doutrina do bispo Cipriano de Cartago que propunha que o crer da Igreja passasse pelos bispos em sínodo ou concílio e não por padres e leigos iluminados.
Ário ensinava que Jesus era Deus até certo ponto. Fora criado pelo Pai e lhe era subordinado. Era de substancia semelhante, mas não era igual nem da mesma substância divina. Na verdade, negava que Jesus fosse Deus. Fez dele um semideus. Esperto, não negou a divindade: apenas a diminuiu e submeteu ao Pai. Eram tais as discussões que uma doutrina chamada patripassionismo ou patripassianismo propunha que como é impossível que um ser humano resgate a humanidade, quem morreu na cruz foi o Pai. Outros raciocinavam que só um humano- divino poderia morrer na cruz. O Filho era, pois, uma só pessoa, mas tinha duas naturezas. A humana morreu na cruz, a divina lhe deu sentido. A natureza divina não abandonou a natureza humana, mas o Homem-Deus Jesus, qual cordeiro divino morreu pelos nossos pecados.
Outras religiões e ateus de hoje riem pelos cantos da boca ao ouvir tal teologia. Mas os cristãos também têm razões para rir dos ateísmos e das outras religiões cujas afirmações também estão cheias de tergiversações. Poderia ser, foi , não foi, é não é, tal partícula gerou outras e por conseguinte…estamos chegando à partícula de Deus…A ciência ateia também já deu inúmeras respostas erradas sobre a vida, sua origem e sua concepção e sobre o morrer. Há mistérios na ciência humana e há mistérios na fé.
Onde acabam as certezas sobre Jesus e onde começa a fé? Ário quis responder com certeza. Também os outros quiseram. O imperador Constantino que embora em 312 tivesse dado aos cidadãos do império a liberdade de culto, mandava na fé pagã e cristã, recorreu aos bispos a princípio aceitou que Jesus era o Filho igual ao Pai. Gerado não criado! Consubstancial ao Pai.
Ário foi exilado. Mais tarde foi a vez de Atanásio amargar cinco exílios. Os dois estavam atrapalhando a vida do império. Mais tarde Constantino voltou atrás, deu ordem para que Alexandria recebe de novo Ário como padre, mas Ário- já o lembramos- morreu de repente em 332 um dia antes de seu retorno. Envenenado como soia acontecer naqueles dias? Enfarto de emoção pela dureza dos embates? Nunca se saberá. Constantino morreria em 336 professando as doutrinas de Ário.
Eram tempos confusos. Qualquer um pregava e qualquer um que tivesse influencia mercadológica, politica e de marketing arrebanhava multidões. Não estranhemos se agora quem mais faz adeptos é quem prega o capitalismo, a mais valia, o sucesso financeiro abençoado, a vitória do indivíduo em Cristo, a riqueza como benção e a prosperidade como teologia. Não foram poucos os que naqueles dias seguiram quem mais certeza oferecesse e ficasse com ele até o fim.
Duros na queda esses dois portentosos negros, orgulho daqueles dias, como gladiadores da Palavra se enfrentaram num duelo de gigantes da fé e do pensamento. Ário perdeu. Atanásio venceu. Hoje oramos o credo influenciado pelo pequeno e grande Atanásio que disse que o “i” de homo-i-ousios negava o Cristo. Jesus era o Cristo e não era só semelhante ao Pai. Era igual, da mesma natureza, gerado eternamente e não a parti de um tempo, não criado, consubstancial. Era eternamente o Filho, mas, por nossa salvação se fez homem e voltará um dia para julgar gloriosamente o mundo. Por enquanto ele se manifstapela sua Igreja.
Depois surgiriam controvérsias que duram até hoje sobre qual igreja o representaria. Os ortodoxos de Constantinopla garantem que são eles que romperam com Roma em 1054 e dizem que os católicos romanos é que são dissidentes. Depois no idos de 1.500, pela voz principalmente do ex monge católico alemão Martinho Lutero vieram os protestantes que hoje se chamam evangélicos e dizem que nós, os católicos romanos nos desviamos das Escrituras. Mais tarde vieram outros evangélicos e os pentecostais que se proclamam mais fiéis aos evangelhos e que romperam com os evangélicos históricos.
A controvérsia parece não acabar nunca. Haverá sempre um novo fundador de novas doutrinas, e novas igrejas a garantir que com eles está a mais verdadeira interpretação as escrituras e que o outro já era, perdeu, perderá e que o mundo e a fé serão como eles.
Há sempre um Ário e um Atanásio a se enfrentarem e os fiéis de um lado e outro a dialogarem ou a se esfolarem vivos ou com palavras duras e ferinas. O datismo deles, a pregação deles, os santos deles, as doutrinas deles, a história deles, os pecados deles, a mensagem deles não valem mais. Deus não age no templo deles. Está certo que saímos deles, mas os infiéis são eles. Saímos para sermos mais fiéis à doutrina original. Quando alguém deles peca, dá-se um jeito de abafar e quando um do lado oposto peca, salienta-se e dá-se um jeito de levar a todo o rebanho que o pregdor de lá prevaricou.
De fato, os tempos mudaram pouco. Ário, Montano, Nestório, Mani, Donato têm seguidores. Também Alexandre, Atanásio, Orígenes e Tertuliano. Estão nos púlpitos de seus templos e nas ruas e praças deixando claro que fora de seu movimento não há salvação. Não deixam a decisão para Deus. Pregam misericórdia, mas antecipam a condenação para quem não aderir à sua doutrina. Nas propostas daqueles irmãos de ontem e até dos imperadores havia boas e más intenções. Hoje também. O difícil é perceber em tempo aonde levam determinadas doutrinas e práticas da fé.
Na madrugada de sexta feira, dia 6 de julho de 2012, quando os católicos festejavam a virgem mártir adolescente Maria Goretti que não se deixou estuprar por Alessandro Serenelli, que de sereno nada tinha, um pregador às 4 da madrugada, pela televisão, programa comprado a peso de outro, desafiava outras igrejas a mostrar o que ele podia mostrar ali mesmo: a cura de câncer de duas irmãs de sangue. A seguir, deblaterava contra outros pregadores, contra o governo e dizia estar pronto a morrer por sua doutrina. Lembrava Ário, Atanásio e outros pregadores dos velhos tempos. Como no século IV era difícil saber quem era mais cristão porque os discursos eram duros, agora continua difícil saber quem é cristão porque os discursos andam endurecendo.
Dois jovens pela Internet no tiwtter insistiam que fora a Igreja ninguém se salvará.
Acharam no discurso e nos escritos do Papa Bento que nunca disse isso, algo que contradissesse João Paulo II na sua Ut Unum Sint, e o Vaticano na sua Unitatis Redintegratio. Podemos oferecer nossa Igreja como caminho mais seguro, mas não compete anos dizer quem se salvará e quem se perderá. O discurso da Igreja mudou, mas o deles não. Ficaram com o Concílio de Latrão e declarações do remoto passado. Quando endurecem os discursos do pregadores de um lado e de outro quem perde é a verdade, a caridade e o diálogo. Jesus dialogava e deixou liberdade para ficar com ele ou ir embora dele.
No fundo de todas as questões a pergunta é a mesma: Se Deus esteve aqui e se encarnou, esteve para quê? . Mandou Pedro guardar a espada na bainha (Mt 26,52) e aos discípulos fechados na redoma do “só nós” disse que respeitassem o homem que exorcizava demônios sem ser do grupo, mas que não ridicularizava seu nome. ( Mc 9,38-41) Um simples copo de água dado por conta de sua doutrina de amor já dispõe alguém para ser seu discípulo. Talvez estejamos preocupados de menos com a doutrina e demais com o marketing da fé. Deveríamos por em primeiro lugar a paz e a caridade, sem esquecer a pureza da doutrina. E se não for possível? Teremos que seguir tentando.
Pior será se insistirmos em dizer que os que não são da nossa igreja irão para o inferno… Se um bispo ou um papa dissesse isso hoje seria considerado herege!
Estamos perdendo milhões de fiéis, mas seria pior se perdêssemos o bom senso e a caridade. Para entrar no céu nãot em que ser católico, mas também não tem que ser evangélico. Tem é que ser caridoso! Se não sabemos lavar não atrapalhemos aquele que morreu na cruz para salvar a todos! ( Jo 12,32 ) Ário tinha seu valores, mas talvez sua canção tenha ido longe demais. Não aceitou corrigi-la.
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